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quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Como pessoa, eu sou mais útil.

Há alguns dias atrás eu assistia uma entrevista do cantor e compositor Gonzaguinha. Na ocasião ele foi perguntado sobre o fato de ser uma celebridade. Sobre isso, ele disse algo que me fez refletir sobre minha identidade: " Como pessoa, eu sou mais útil".
Eu comecei a pensar nas identidade que eu já assumi, afim de cumprir uma função profissional, social ou religiosa. Quantas vezes eu fui apenas um professor, um crente, um vizinho ou displicente  colega de turma. Não que qualquer um, não seja inevitavelmente estas coisas, mas  o problema está em ser unicamente estas coisas.
Além de mim, existem os políticos profissionais, os sacerdotes profissionais  ou  os profissionais profissionais.
Indivíduos que  abandonam a suas personalidades, suas humanidades, para se tornarem ícones de uma função ou instituição.
Não choram, se coçam ou têm insônia.  Não cheiram mal, dão risadas ou contam piadas.  Se resumem a cálculos, sermões e entrevistas. Não ousam assumir fraquezas  ou vontades pessoais.  Super homens e super mulheres sempre triunfalistas, inacessíveis  ao erro ou  à vida comum.
O problema mesmo é quando o profissionalismo contamina membros da família. Aí você encontra pais ou mães, que abandonaram o status de pessoas e assumira o único papel de genitores.
Conheço algumas mães que deixaram de ser pessoas.  Eram boas amigas, se relacionavam, tinham sonhos, eram gente boa.  Mas a maternidade, uma indiscutível bênção,  reduziu a pluralidade pessoal destas mulheres e elas foram transformadas simplesmente em mães profissionais. Sem vida social ou  projetos para o futuro. Seus destinos  se resumem em cuidar dos  filhos até que eles deixem de existir.
Preciso cuidar em permanecer  sendo pessoa. Em casa ou no trabalho. Na igreja ou no bairro. Minha família precisa me enxergar como pessoa que erra e acerta e que tem outras atividades e aspirações. Meus colegas de trabalho precisam me enxergar como alguém como nome, sobrenome e que  gosta de feijão com cuscuz.
Minha pessoalidade não pode sucumbir ao meu profissionalismo, paternidade ou função eclesiástica.

Preciso ser gente, afinal como disse o poeta, como pessoa, eu sou mais útil.

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Parabéns aos Bombeiros!

Senhoras e senhores,
queremos nos unir a toda população  que reconhece os valores dos bombeiros, para dizer nosso muito obrigado.
Obrigado pelo incansável esforço de livrar, defender, proteger, apoiar, salvar e tudo mais, feito com bravura por vocês.
Obrigado por não dormir, quando todos estão dormindo, obrigado pela agilidade em chegar primeiro nos locais onde precisam de vocês, obrigado por não desistir dos resgates perigosos.
Prestamos aqui nossa homenagem a vocês  que realizam os sonhos de todas a crianças. Sim porque toda criança quer ser um bombeiro, valentes e destemidos como vocês. Digo melhor, o sonho de qualquer ser humano, é ser um bombeiro. O médico e o professor, ainda sonham em ser como vocês. O comerciante e a enfermeira, no fundo, gostariam de vestir esta farda bonita, subir no caminhão vermelho e espalhar esperança pela cidade.
Já que não podemos todos ser bombeiros, podemos pelo menos declarar nosso orgulho em ter em nossa região, homens e mulheres, heróis de verdade, com quem podemos contar.

Mais uma vez, e sempre que tivermos oportunidade, declaramos nossa gratidão profunda a vocês, bombeiros.

Ele e ela, Super- heróis


 O cinema criou termos para designar a importância dos atores . É uma classificação que estabelece uma hierarquia nos papéis dos participantes de uma obra cinematográfica.
O primeiro deles, e o mais importante é o protagonista. O protagonista é o personagem principal,  o herói.  Ele  luta e vence a luta, ele disputa a garota e fica com ela, ele atira,  acerta e não leva tiros e sempre termina  numa situação confortável.  O mundo  da ficção gira em torno do protagonista.
Logo depois vem o coadjuvante. O ator coadjuvante é responsável por dar suporte ao ator principal, o protagonista.  É um ator secundário, de menor importância.Ele representa alguém que  passa a bola, mas nunca faz o gol. Vai para a guerra, mas não elimina o inimigo principal. Ele apresenta a garota ao amigo, mas o amigo é quem termina com a garota. O coadjuvante existe em função do outro.
Finalmente existe o figurante. O figurante também participa do filme, ele está na cena, veste-se com um figurino e anda de lá para cá, mas  não é percebido. Ele está ali para compor  o cenário, mas não interfere na cena em nada. O figurante é ainda menos importante que o coadjuvante e não passa de um detalhe diante do brilho do  protagonista. Ele  não fala, não reclama, não opina, não decide nada. O figurante é um elemento quase sem importância em um filme.

Na vida real, existem relações que se comparam ao cinema. As escolhas, os traumas, os medos levaram homens e mulheres a desempenharem papéis de protagonistas, coadjuvantes ou meros figurantes.
Numa relação onde o marido ou a esposa, isoladamente, são os astros da casa existe apenas um protagonista. O protagonista do lar impõe as idéias, decide sobre os rumos do relacionamento, exige mudança nos comportamentos, quer que o seu prazer  tenha prioridade e está sempre no foco desta relação.  O protagonista do casamento é sexualmente bem sucedido, afinal ele é o protagonista, e os protagonistas são aqueles que vencem no final.

Já os coadjuvantes da família, recebem os amigos e servem as bandejas, ouvem  os elogios sobre o parceiro ou  parceira e com um sorriso amarelo concordam com o que foi dito. O coadjuvante da relação vive em função do outro. Tudo está bem se o outro está bem. O coadjuvante desiste do sonho profissional para acompanhar  o protagonista da sua vida e, sexualmente   falando, o coadjuvante não tem primazia no prazer, se foi bom para ele ou ela, curte-se a frustração em silêncio.

Eu não deveria perder tempo com os figurantes, afinal não sabemos seus nomes ou endereços. Nas famílias ainda existem alguns. Maridos anônimos e esposas desconhecidas. São indivíduos que nunca aparecem nas festas, nos encontros sociais, nas reuniões de amigos e pior, não parecem em seus próprios casamentos. Eles não têm nome, são conhecidos como  Meu marido, dona encrenca, o chefe, a Patroa. Onde está sua esposa? Ficou com as crianças, é a reposta. Seu marido não veio?  Ele não gosta destes eventos, prefere ficar em casa.  Ninguém conhece o esposo da secretária ou a mulher do simpático porteiro. Desconhecidos, desimportantes, não passam de elementos para compor o cenário conjugal. Não se tem notícia se existe intimidade entre este casal, assim não possível falar em realização sexual.

Gosto de um filme infantil produzido alguns anos atrás: Os incríveis. Uma  animação de Hollywood em que todos os membros da família eram protagonistas.  Juntos eles perdiam e venciam. Lamentavam e comemoravam um ao lado do outro, complementavam seus poderes com o objetivo de atingir seus objetivos. Cada um com sua característica colaborava para o sucesso da família super-poderosa.  

A vida deveria imitar a arte para corrigir alguns desvios reais.  Na relação conjugal, não pode existir figurantes ou coadjuvantes.  Os dois  são heróis, são atores principais do casamento, são parceiros e cúmplices, comparsas e inseparáveis  protagonistas. Os elogios são para o marido e para a esposa. Os dois enfrentam juntos a glória e a derrota. Estão sempre juntos na igreja, nas festas, no restaurante e no prazer. Dependem um do outro e servem um ao outro.  No filme da existência são socialmente úteis, satisfeitos sexualmente, maduros diante das frustrações, colaborativos e gregários. Perdem juntos, ganham juntos, sofrem juntos, gozam juntos.

São, do dia-a-dia,  do palácio ou da palafita, torcedores do Paysandu ou do Vitória, camelôs ou funcionários públicos, tímidos ou extrovertidos, são do interior ou da capital, mas são, devem ser, na relação conjugal, Ele e ela, Super Heróis.

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Viva a mulher normal

O ser humano costuma valorizar o diferente. Quando a maioria aprecia determinada tendência, o diferente surge como uma alternativa atraente. Mesmo que o diferente não seja na realidade tão atraente, ele aparece como uma espécie de atitude política libertadora . Você deve lembrar de líderes mundiais como Gandhi, com sua simplicidade e proposta de não violência. Diferente da maioria, que pregava que a força dominaria, Gandhi impressionou o mundo e conquistou discípulos. Martin Luther King, que decidiu ser diferente de outros e enfrentar o racismo com inteligência e uma postura equilibrada. Entrou para história e atraiu admiradores. Podemos citar também posturas como os boicotes, greves de fome, marchas de protesto, o cabelo de Neymar???


Precisei desta introdução para falar sobre o que é ser uma mulher diferente hoje em dia.

Quando se começou a ver na TV as mulheres impossíveis, inatingíveis, inalcançáveis com seus corpos esculturais, esculpidos por academias, bisturis e silicones, o mundo babou e discriminou as mulheres gordinhas, baixinhas e com espinhas. Estas passaram a se sentir inferiores e algumas, depois da depressão inicial, buscaram atingir aquele padrão de beleza. Outras desistiram de vez e se entregaram à sarjeta da gula e da ociosidade.

As mulheres “perfeitas” foram ovacionadas, admiradas e eleitas como ideais, pela mídia tendenciosa e a população subserviente. Enquanto isso, as mulheres “normais” tiveram que seguir suas vidas comuns de profissionais bem sucedidas, donas de casa competentes e até presidentes da República.

Até que o diferente chamou a atenção. Diante de tantas glúteos e bustos inflados artificialmente, diante de músculos quase masculinos, a beleza mudou de rumo e proclamou o diferente como Belo. Gordurinhas estão em alta. Estrias e celulites na medida certa, são atraentes. Peitos e bumbuns comuns passaram a cumprir sua função original. Só que desta vez, aliados à beleza comum, estão a capacidade, a inteligência, o carinho, a maternidade, a cumplicidade, a autenticidade. Atributos adquiridos pelas mulheres normais nos anos de ostracismo. Assim, temos verdadeiramente a mulher ideal: corpo, mente e alma. A despeito dos pneuzinhos disfarçados pela cinta modeladora, a mulher normal está em alta. Não estou falando das fracas que não se reabilitaram do descuido com o corpo. Estou falando daquelas que respeitam a gravidade e o tempo. Daquelas que assumem as rugas e se orgulham do peito que amamentou. Daquelas que priorizam a essência em detrimento da forma. Viva a mulher normal!

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Para todo mal, a cura.


De onde virá a solução para o conflito entre palestinos e israelenses?
Quem finalmente descobrirá a droga que poderá nos tornar imunes às doenças cada vez mais invencíveis?
Que governo conseguirá impedir que a violência urbana nos torne cada vez mais prisioneiros das nossas próprias casas?
Quando  a desigualdade social se tornará uma triste lembrança do passado?
Como pobres, mulheres, negros, religiosos e outras minorias deixarão de sofrer com a discriminação?
Qual a probabilidade de a morte deixar de ser o fantasma inevitável dos habitantes da terra?
Uma otimista canção de Lulu Santos propunha que de algum lugar, ou de alguém, haveria  a solução definitiva, segundo o compositor esperançoso  ...Será quando menos se esperar, aonde ninguém imagina...
Eu, Lulu, você e a esmagadora maioria da população mundial, espera com ansiedade o fim definitivo da dor, saudade, opressão, preconceito, da morte.
Alguns acham que a libertação virá do esforço coletivo ou de alguma decisão mágica da ONU. Outros acreditam sinceramente que o exército americano, que já derrotou alienígenas e meteoros gigantes no cinema, poderá proteger  o planeta e nos livrar da noção de que o           “ inferno é aqui”.
Também tenho minha esperança. Ela não vem de índices positivos da bolsa de valores, do aumento do poder de compra ou dos altos investimentos na saúde pública. O clima de otimismo que paira à nossa frente é só otimismo. Minha esperança é a mesma de alguns anos atrás, no entanto, continua atual: e convicente : O Sol da Justiça, Aquele que é, sabe, pode e tem para todo mal, a cura.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Pérola da cultura contemporânea

Um despretensioso filósofo contemporâneo escreveu com sabedoria sobre a necessidade de respeitar o outro na singularidade da sua escolha.

Há que se aprender com este artista, exímio observador do comportamento humano. Há que se praticar sua proposta, visível necessidade de ajuntamentos humanos que possuem alguma proximidade fraterna.

Através de uma frase simples, este sábio compositor demonstrou que na simplicidade há soluções eficazes. Sua genialidade o levou a redigir uma observação que deve servir de reflexão para indivíduos que acreditam ter nos outros, extensão de si mesmos. Embora haja a necessidade de um interesse afetuoso pelo próximo, o respeito pela individualidade e autonomia de cada um é mister. A consciência da existência de um limite entre a convicção de um e a convicção do outro é de fundamental importância para a manutenção de relacionamentos saudáveis. Assim, o poeta expôs aquilo que pode ser chamado de pérola da cultura contemporânea:

ADO,ADO, ADO, CADA UM NO SEU QUADRADO.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Os incomodados que se retirem

Eu já ouvi algumas vezes a frase que soa como um desaforo. Em um ambiente onde todos, ou a maioria, tem uma opinião em comum e alguém sugere mudança, provavelmente este alguém ouvirá a sugestão: Os incomodados que se retirem.
Penso que a despeito da agressividade ou desprezo contido nesta declaração, há verdade e coerência na sentença dita aos incomodados. Eles devem de fato se retirar. Retirar-se do estádio ao invés de atirar pedras e xingar os atletas, retirar-se da classe ao invés de discutir com o professor arrogante, retirar-se do trabalho ao invés de insistir no ambiente que causa terror quando deveria trazer prazer.
Os incomodados, caso permaneçam no lugar de onde deveriam se retirar, provavelmente serão infelizes, terão náuseas, desentendimentos, gastrite, depressão, ou em casos extremos, morrerão em decorrência da insistência em permanecer em um ambiente que lhes causa incômodo.
Há outros lugares para ir. Lugares mais arejados ou aquecidos, lugares mais iluminados ou sombrios, lugares mais agitados ou sossegados. Há outros cinemas, teatros, escolas, igrejas, trabalhos ou times de futebol para torcer. Há outros amigos, namoradas, patrões, sacerdotes, cantores ou vizinhos.
Os acomodados que permaneçam. Permaneçam na mornidão, na conveniência, na subserviência, na falta de horizontes, na tradição, no acolhimento de falsos amigos.
Muito provavelmente, acomodados e incomodados não viverão bem em um mesmo ambiente. São indivíduos opostos, que vêem o outro como pessoas com problemas de adequação.
Não posso afirmar que todos os incomodados são bem sucedidos. Mas não existe na acomodação o sabor de um novo momento, de uma nova experiência religiosa ou a realização de ser seu próprio patrão.
Os incomodados provavelmente quebram a cara mais frequentemente, mas também, conseguem novas sensações e oportunidades.
Os incomodados que se retirem, sejam felizes e encontrem a temperatura ou turma certa.
Os incomodados que se retirem e descubram a profissão que lhes traz mais satisfação.
Os incomodados que se retirem antes que se transformem em acomodados.

Os incomodados que se retirem.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

O refrigerador


Dona Maria, ao mesmo tempo que limpava a geladeira, elogiava o aparelho como se fosse um membro da família.
- Compramos esta Consul em 48 prestações. Era o ano de 1984. Eu e meu velho estávamos na maior dureza. Não me desfaço desta geladeira por nada neste mundo. Vejo na TV uns modelos novos que saíram, mas não me enchem os olhos. Prefiro a minha Cônsul, ela é como se fosse da família.
Dona Maria tinha razão. O objeto era antigo, mas funcionava direitinho. Conservava bem as sobras do almoço que viravam jantar. Gelava rapidinho os picolés de cajá que fazia para os netos Lucas e Marília. E seu maior gosto era tirar a água fria da Velha geladeira e servir para o esposo, Seu Oscar.
Um sábado à noite, convenceram dona Maria a ir visitar o Shopping recém inaugurado perto da sua casa. Foi uma vez em um Shopping que ficava muito distante e decidiu que não voltaria nunca mais naquele lugar. Dava vertigem andar em um piso tão escorregadio. Mas os netos insistiram e ela cedeu.
Viu livrarias, quiosques espalhados pelos corredores, tudo era realmente bonito. Lucas, o neto de seis anos, parou então diante de uma loja de eletrodomésticos, viu um desenho animado na TV em exposição, e ficou ali assistindo.
- Vamos Lucas! Temos que lanchar agora. Falou a mãe do garoto.
- Deixa ele aqui um pouco, eu cuido do bichinho. Dona Maria defendeu o menino.
Foi quando ela viu o monumento branco perto dos fogões. Dona Maria foi levada involuntariamente para perto do daquele escândalo. O vendedor se aproximou e notando o interesse da mulher apresentou o aparelho à senhora hipnotizada:
- Este é um refrigerador frost Free, com 100 litros de capacidade. Não precisa descongelar e tem um compartimento exclusivo para verduras e frutas. E ainda tem garantia de dois anos. É o último lançamento da White Westing House.
Aquele nome difícil encantou ainda mais Dona Maria que pediu licença para abrir as portas do refrigerador mágico. Ela disse ao vendedor que tinha uma Cônsul, comprada em 84 em 48 prestações, mas sentiu que deveria não dar mais detalhes da velha geladeira, para não humilhá-la diante daquele escândalo de refrigerador.
Dona Maria nunca imaginou que seus pensamentos seriam invadidos pela imagem de um lançamento da White Westing House. Mas ela simplesmente não conseguia parar de pensar no refrigerador que trazia fantasias geladas à sua mente. Picolés ficariam mais gostosos, água mais fria e refrescante e o jantar ficaria mais saboroso com as sobras do almoço. Na saída do Shopping, Ela ainda pediu para passar em frente a loja. Deu uma olhada disfarçada para a seção de refrigeradores e sorriu discretamente. A imponência do refrigerador de nome difícil, mexeu com Dona Maria. Mas ela não poderia expressar sua empolgação como refrigerador. Afinal, tantas vezes suas filhas tentaram convencê-la a trocar a velha geladeira por um aparelho mais novo e ela insistiu que não faria isto jamais.
Ao chegar em casa, um ruído lhe chamou a atenção, vinha da cozinha. Seu Oscar disse que não ouviu nada. Mas Dona Maria disse que havia algo errado. Ela se abaixou e descobriu que o motor da cônsul 84 estava com um barulho estranho.
- Há anos que ouço este barulho Maria! Já te falei, esta geringonça precisa de revisão. Disse Seu Oscar deixando a cozinha.
Foi quando a dona de casa, expressou pela primeira vez um comentário herético sobre a velha geladeira comprada em 48 prestações, quase um membro da família:
Esta velha ronca e eu nem me dei conta!
Mas eu não troco a minha Cônsul por nada neste mundo!

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

A coerência de Steve Jobs

Esta semana o mundo ficou sabendo da morte do presidente da Apple, Steve Jobs. É claro que a família e os amigos, os sócios e empregados deveriam ter lamentado o fato. Mas foi uma surpresa ver os clientes da empresa promovendo homenagens por todo mundo. Vi alguns com velas virtuais, exibidas nas telas dos Ipads, demonstrando a tristeza e a influência do empresário americano sobre suas vidas. Sinceramente, sem querer parecer ser insensível, me perguntei a razão da comoção mundial. O que fez este homem para merecer tantas homenagens dos usuários dos produtos criados por ele? Será que se o presidente da Bombril falecesse, as pessoas reagiriam da mesma maneira? Por que um dono de uma empresa de tecnologia conseguiu na sua morte sensibilizar tanto seus clientes?
Dias depois da notícia, acompanhei pela TV algumas outras informações sobre Steve e talvez descobri a razão do lamento: a coerência entre o que falava e o que produzia.
Steve era conhecido como um dos mais bem preparados palestrantes do mundo. Havia criatividade, bom humor e consistência em suas palestras. Empresários do mundo inteiro disputavam um lugar nas platéias onde Jobs falaria. Ele os fazia refletir, dar risadas e mudar de atitude a partir dos seus conselhos inteligentes. Era comum ouvi-lo falar em mudar o mundo, em ter amor por aquilo que se faz, em viver intensamente o hoje. Mas estas declarações não se diferem das palestras dadas aos montes por milhares de palestrantes espalhados por aí. Alguns são realmente muito bons. Qual então a diferença entre Steve Jobs e qualquer outro empresário que utiliza o sucesso de suas empresas para abocanhar o mercado das palestras motivacionais? A resposta é: A qualidade dos seus produtos.
Há quase uma unanimidade quando o assunto são os produtos da Apple. Eles são inovadores, estáveis, confiáveis, bem desenhados e por isso conseguiram ser, além de tudo isto, amados por seus clientes. Assim, aliando um discurso excelente a produtos de alta performance, Steve Jobs conseguiu mais que clientes, ele conseguiu seguidores.
É possível ter um bom produto e agradar a muitos, mas se não houver um bom discurso para promovê-los, se não houver a exposição pessoal do líder e seu comprometimento público, se não se perceber os argumentos adequados, provavelmente você terá apenas um bom produto. Por outro lado, se o argumento bem elaborado for usado com criatividade, se o discurso for feito com eloqüência ou a proposta for apresentada com esmero e o produto ou o serviço não estiver aliado a uma excelente qualidade, fica a impressão que houve mais aplausos que espetáculo. A coerência de Steve Jobs se deu pela união da excelente oratória com um excelente produto. Assim, aqueles que se emocionavam com suas palestras, experimentavam em suas próprias casas e escritórios a veracidade do que foi ouvido nos auditórios e se tornavam divulgadores ardorosos dos equipamentos criados pelo gênio da tecnologia. Como conseqüência, a maçã pela metade estava em filmes, adesivada em carros e orgulhosamente exibida e camisetas. Propaganda de graça para o homem que alcançou corações com palavras e ações.
Há alguns meses atrás, comprei um produto da Apple. Até então, o objeto não passava de um tocador de áudio. Hoje, depois de saber mais sobre memorável senhor Jobs, terei mais respeito pelo pequeno dispositivo, ele é um símbolo de coerência.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

A escola é uma coisa, o ensino é outra.

Hoje eu assisti uma entrevista do ator Dan Stulbach para uma emissora de TV. Nela, ele sabiamente disse a frase que está no título deste texto: A escola é uma coisa o ensino é outra. Como professor, eu tenho entrevistado alguns pais que esqueceram disto. Eu digo esqueceram, porque eles próprios já experimentaram a dicotomia ensino-escola. Hoje, eles encaram a escola como uma embalagem de um conteúdo que é o ensino. Mas nem sempre foi assim para estes pais esquecidos. A escola é tão conteúdo quanto o ensino. Os pais sabem disto. Lá na escola, eles aprenderam muito mais sobre a vida do que as teorias ou teoremas puderam lhes ensinar. No pátio da escola aprende-se sobre o namoro, informação que não consta na gramática de Napoleão de Almeida. No corredor da escola, conhecemos amigos que não encontramos nos compêndios da Editora Ática. O ensino é imprescindível, em algum momento será necessário, mas escola entra para nossa vida. Trazemos de lá as piadas, os velhos amigos, as boas lembranças, o primeiro beijo, o soco no olho. Levamos para vida os conselhos insistentes dos mestres, a leveza do professor de Educação Física e a disciplina do professor de matemática.

As equações do 2° grau, as análises sintáticas, os verbos regulares e irregulares nos ajudarão em vestibulares e concursos. Mas e depois da prova? Depois da prova temos a escola como companheira. Contaremos aos nossos filhos sobre os campeonatos de futebol e basquete, as broncas da diretora, sobre Seu Pedro, o velhinho simpático que vendia lanches na cantina. Ensinaremos as técnicas de construir barcos, aviões e balas, tudo de papel. As informações adquiridas na escola são de fato preciosas.

Arnaldo Jabor escreveu um livro que tinha como título Amor é prosa, sexo é poesia. Se pudermos aplicar o mesmo princípio a esta situação, diríamos que o ensino é prosa, a escola é poesia. É literalmente poesia. Cantávamos sobre o nosso lanchinho, sobre a hora de descansar e até sobre o próprio ensino, paródias criativas criadas ou copiadas por nossos professores. A escola é uma coisa, o ensino é outra. O pais da minha escola precisam lembrar, que no dia a dia de suas profissões há muito mais de escola que de ensino. As pegadinhas com os colegas de trabalho, vêm da escola. A ironia com a bronca do chefe, vem da escola. O futebol depois do trabalho, vem da escola.

Todo estimulo deve ser dado para que haja esforço na obtenção do conhecimento. Deve haver empenho de professores e equipe pedagógica na transmissão de conteúdos. O ensino, precisa ser tratado com responsabilidade e encarado como uma missão. Mas nunca, jamais, devemos achar que escola não passa de um preparo para vestibulares e concursos públicos. A escola transcende o aspecto acadêmico. Ela, como próprio nome diz é uma escola, que prepara para o esporte, para relacionamentos, para enfrentamentos, para o futuro e para a vida. E ainda que haja no ambiente escolar o envolvimento com questões acadêmicas, uma coisa precisa ficar claro: A escola é uma coisa, o ensino é outra.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Professor, profissão perigo.

Ontem à noite assisti o filme Tropa de elite 2. O filme mostra o trabalho do BOPE (Batalhão de Operações Especiais) do Rio de Janeiro na luta contra o tráfico de drogas e a corrupção. O incrível é que na guerra que se trava no filme, excetuando o Capitão André ( André Ramiro), que é baleado e morre, nenhum outro policial é ferido. Se transformassem a realidade em ficção, a profissão de professor seria muito mais perigosa que a de Policial Militar, dado a frequência com que professores têm sido agredidos. Hoje o G1 publicou uma matéria denunciando uma mãe de uma escola pública em São Paulo que agrediu uma professora no estacionamento da escola, causando várias fraturas na cabeça e ferimentos no rosto. Só por curiosidade, coloquei as palavras “Professora” e “agredida” no campo de busca do portal e uma série de textos noticiando agressões contra professores apareceu na tela no computador. Seguem algumas:

01/06/2011 07h42 - Atualizado em 01/06/2011 07h42
Professora é agredida por mãe de aluna em SP
Vítima foi atacada no estacionamento quando deixava colégio.Aulas foram suspensas em protesto nesta terça-feira.
25/05/2011 19h06 - Atualizado em 25/05/2011 19h17
Professor é agredido com capacete por aluna no interior de SP
Ela se revoltou ao saber que ia ser punida por não ter feito a lição de casa.Caso ocorreu em escola estadual de Sorocaba na sexta-feira (20).
07/04/2011 21h25 - Atualizado em 07/04/2011 21h36
Professora é agredida durante briga de alunos no interior de SP
Vítima registrou boletim de ocorrência e fez exame de corpo de delito.Agressão teria acontecido dentro da sala de aula.
Do G1 SP, com informações da EPTV
16/03/2011 14h06 - Atualizado em 16/03/2011 14h06
Professora é agredida por uma carteira escolar lançada por um aluno
A agressão ocorreu em uma escola estadual em Guaimbê, no interior de São Paulo. Essa é mais uma história absurda de violência nas salas de aula.
07/01/2011 19h50 - Atualizado em 07/01/2011 19h50
Aluno do Recife agride professor após reprovação
09/12/2010 20h35 - Atualizado em 09/12/2010 20h35
Professor é agredido por aluno em universidade na Zona Norte de SP
Vítima sofreu lesões no braço e no rosto e precisou ser levado a hospital.Agressões ocorreram na noite desta quarta-feira (8) no UniSantAnna.
12/11/2010 14h12 - Atualizado em 12/11/2010 14h12
Professora é agredida dentro da sala de aula em Porto Alegre
Aluno teria se revoltado por causa de uma nota baixa. A professora sofreu fraturas nos braços e ferimentos no rosto.



Assim, além de agendas e pinceis, o professor de hoje precisa de capacete e escudo (talvez cacetete) para trabalhar em algumas escolas do país. E assim como no filme Tropa de Elite, a vida imita a arte e as autoridades são coniventes com os agressores que são estimulados a repetir a violência pela certeza da impunidade. Ouve-se então no silêncio dos governantes a célebre frase do Capitão nascimento, desta vez dirigida aos mestres de uma tropa cada vez mais sub-valorizada: Pede pra sair!

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Ex-chatos

Ontem eu escrevi um texto sobre os chatos. Comentei sobre como são inadequados, inoportunos e como nos esforçamos para conviver com este grupo. É claro que brinquei sobre o assunto. Hoje volto a falar sobre o mesmo tema, dessa vez sem brincadeiras. Deus ama os chatos. Falo isso por sentir seu amor por mim sendo eu, alguém que insiste em questionar quase tudo, que me proponho a reformular o que já está estabelecido, que não me controlo e opino sobre qualquer assunto que não tenho conhecimento suficiente, que critico muito mais do que elogio, que tenho alguns pontos de vista parciais e sem fundamento e que me envolvo em discussões por motivos absurdamente sem importância. Sou assumidamente um chato.

Mas eu meus colegas de personalidade instável, podemos experimentar o amor de Deus. Ele me ouve quando ninguém mais suporta ouvir a mesma história, Ele não se cansa de rir das repetidas piadas sem graça, Ele está perto quando todos me evitam, Ele demonstra Seu carinho incondicional quando estou irritado e convive revelando seu amor a despeito de minha chatice. O que quero de fato é dizer que Deus ama a todos, e isso inclui os chatos. Aqueles que são desprezados, imorais, infelizes, desgraçados, aqueles que não tem mais nenhuma chance a estes Deus ama profundamente. O estranho não é dizer que Deus ama a todos, mas dizer que Deus ama a todos igualmente. O cara legal, o cristão comprometido, o caridoso, o religioso exemplar experimentam amor na mesma quantidade que aqueles que têm um comportamento oposto a estes bons indivíduos. É difícil entender isto porque escolhemos a quem amar e nossas escolhas sempre são convenientes. Mas Deus não escolhe a quem amar. Ele ama o joio e se empenha em transformá-lo em trigo.

A lição de hoje é que preciso imitar a Deus e discriminar menos aqueles que são muito diferentes de mim. A manutenção dos meus princípios não é ameaçada pela demonstração de afeto a quem guarda outro dia da semana, a quem consome carne suína ou espera uma recompensa imediata após a morte. Mais, meus princípios deveriam me estimular a amar drogados, homossexuais, prostitutas e todos os outro que também são amados de Deus.

Quando Jesus vier, Ele levará consigo ex-pecadores, transformados pela sua Graça. Quero estar lá, um ex-chato salvo e vivendo uma nova vida.